Tecnicamente, as sondagens de opinião relativas às eleições partidárias não são diferentes daquelas em que nos perguntam se preferimos bombons de chocolate ou rebuçados… e por que razão! Entre respondentes e abstencionistas, todos pensamos nas razões de votar em tal ou tal partido ou, mais radicalmente, abster-nos ou não votar. As sondagens feitas com amostras pequenas não distorcerão porventura as tendências sócio-demográficas mas os resultados reduzem inevitavelmente muitas das relações de causa-efeito ao nível ideológico-partidário dos inquiridos, o que torna difícil – se não impossível – «adivinhar» os resultados de eleições sem prazo marcado.

É isso que sucede com uma recente sondagem sobre a «temperatura partidária» do país, a qual foi reduzida, interpretada e/ou distorcida pelos órgãos de comunicação social. Palpites não deveriam, portanto, aceitar-se… Mas são irresistíveis, pelo que as sondagens ganharam uma tendência crescente para orientar as estratégias dos partidos, afectando as ilações certas ou erradas dos futuros eleitores a todos os níveis, a começar por votar ou abster-se.

A última eleição parlamentar, que deu uma maioria marginal ao PS, foi o exemplo acabado da degradação do sistema eleitoral português ao cabo de menos de 50 anos. Ora, para que o país tivesse assimilado um genuíno carácter democrático após o 25 de Abril, os vencedores do «golpe» teriam começado por submeter aos eleitores a proclamada Constituição de 1976, bem como sucessivas alterações constitucionais como a adesão à actual União Europeia, para dar apenas um exemplo! Não sou constitucionalista, mas estou certo que a maioria dos países da UE votaram mais de uma vez as suas respectivas constituições: veja-se a Espanha e a evolução do corpo eleitoral perante a Constituição democrática.

Regressando à sondagem do ICS-ISCTE, basta lembrar que a maioria eleitoral do PS há pouco mais de um ano, além de mínima – cerca de 41% dos votantes – representou apenas 20% dos eleitores, valor muito abaixo da primeira maioria do PSD em 1987 com mais de 50% dos eleitores, assim como do próprio PS em 1999 já com escassos 44% de eleitores em apenas 60% de votantes…

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Como se vê, as curtas maiorias de Sócrates e Costa obtidas com os votos de um corpo eleitoral cada vez menor, denotam a debilidade dessas maiorias e o risco de vida curta perante qual a sondagem do ICS-ISCTE nos coloca em suspenso. Neste momento, é manifesta a baixa apreciação do governo PS por parte dos inquiridos, perto de dois-terços dos quais prometem a derrota do PS numa próxima votação, quando a opinião dos votantes quase inversa há menos de seis meses… É duvidoso, pois, que sejam exactamente os mesmos grupos eleitorais a ser inquiridos agora.

O modo, porém, como os inquiridores «cruzaram» a posição político-ideológica e a apreciação da situação sócio-económica só não é devastador, neste momento, para metade dos entrevistados que agora se declaram simpatizantes do PS. Outro factor de índole partidária maciçamente adverso ao PS na área da economia é a coincidência dos simpatizantes do PSD com os «sem partido», os quais declaram que a economia está em queda há perto de três anos sucessivos, o que é manifestamente desfavorável ao PS.

Daí o manifesto desalento do primeiro-ministro e dos seus seguidores próximos perante os próprios membros do PS que se manifestam neste momento desavindos. Daí, porventura, o inesperado lançamento da «questão da habitação» de forma a continuar a mísera política distributiva que os governos socialistas têm praticado desde o dia em que tomaram o poder à revelia da prática parlamentar seguida até então: estou a falar da «geringonça» que o PS nos impôs com os resultados que se viram…

Para além do inevitável descontentamento da grande maioria de inquiridos com a evolução da situação nacional e internacional em que tanto o PS como o resto do país estão imersos, acresce uma série de mais dois factores sem avaliação neste preciso momento por mais inter-relacionados que estejam, a saber, a guerra sem termo entre o Leste e o Ocidente e a crise económico-financeira igualmente em curso. Como se pode entrever pela confusa evolução do mundo ocidental, os sistemas político-partidários têm a maior das dificuldades em acertar nas medidas a tomar a fim de debelar qualquer dos factores citados.

Quanto à Rússia e os seus aliados, alguns dos quais não temos ideia clara da sua actuação, nada garante qualquer das decisões militares: a rendição parcial que seja da Rússia ou o recurso desta à bomba nuclear… e a guerra mundial que se sucederia. Quanto à rendição da Ucrânia, custa imaginá-la por mais limitada que seja, mas à medida que o tempo passa, os Estados Unidos podem ter de renunciar à derrota da Rússia. Quaisquer dos factores mencionados são demasiado imponderáveis para permitir conceber o futuro próximo, não falando do longínquo! Na probabilidade de a guerra continuar, é improvável e certamente indesejável que o PS se mantenha por muito mais tempo…